domingo, 6 de março de 2011

Desafios do Novo Governo

Por  Antonio Lanzana e Luiz Martins Lopes -  Professores  da FEA/USP.

O quadro atual vivido pela economia brasileira mostra que, embora o País tenha registrado progressos inquestionáveis, o crescimento potencial do produto, em torno
de 4,5%, é muito inferior à média dos demais países emergentes (com efeito, enquanto no período 1994/2009 o PIB brasileiro cresceu à razão de 3,4% ao ano, os emergentes registraram 6,8% ao ano).
O grande desafio da economia brasileira para os próximos anos é acelerar o ritmo de crescimento potencial do produto sem perder a estabilização tão duramente conquistada.
A superação dessa limitação passa, necessariamente, pela elevação da taxa de investimento. Os níveis atuais de investimento (18% e 19% do PIB) não garantem crescimento sustentado com taxas superiores ao ritmo observado (cerca de 4,5%
ao ano).

Analisando-se as causas da reduzida taxa de investimento no Brasil, pode-se verificar que os desafios se concentram em três áreas: elevar os investimentos públicos, criar um ambiente regulatório propício à atuação do investimento privado na área de infraestrutura e gerar um clima mais favorável para os investimentos.
No que se refere ao primeiro item, percebe-se que nos últimos anos o governo reduziu significativamente os investimentos, apesar do aumento expressivo da receita.
A tabela mostra que enquanto na década de setenta (último período de crescimento acelerado do País) o governo tinha uma poupança da ordem de 5,5% do PIB (com uma carga tributária de 25,3%), no ano passado a poupança pública foi negativa em 2% (com uma carga tributária de 36% do PIB).

Na realidade, a grande distorção da política fiscal brasileira encontra-se no crescimento substancial das despesas correntes, as quais passaram de cerca de 20% do PIB na década de setenta, para 38% do PIB nos dias atuais. Com isso, a disponibilidade de recursos para investimento se contrai e explica a precária situação dos bens e serviços oferecidos pelo governo (portos, estradas, aeroportos, saneamento básico etc.).
É importante ressaltar, por outro lado, que a contração dos investimentos públicos afeta os investimentos privados dada a complementaridade entre ambos.

É natural que, ao analisar suas decisões de investimento, o setor privado leva em consideração a disponibilidade da infraestrutura; afinal, como pensar em investir para exportação, por exemplo, se os portos estão em condições precárias? E mesmo para o mercado interno, como aumentar a produção, se não há disponibilidade de estradas adequadas para transportar essa mesma produção?

Além disso, a ausência de infraestrutura faz com que muitas empresas preencham esta lacuna com investimentos próprios, saindo dos respectivos “core business”, o que reduz a produtividade não somente da empresa, mas da própria economia, na medida em que seria natural que ela fosse mais eficiente naquilo que é o seu foco de atuação.

A superação dessa distorção passa por uma nova dinâmica da política fiscal, com significativa expansão da poupança pública, o que permitiria não apenas ampliar os investimentos públicos, e ainda prover os recursos necessários para uma atuação mais decisiva e menos onerosa no mercado de câmbio. Uma taxa de poupança pública de 5% do PIB seria o mínimo necessário para atender as necessidades do País.
Muitos países superaram as carências de investimento em infraestrutura
atraindo o setor privado para atuar nessas áreas. Dado que muitos dos segmentos de infraestrutura representam, na realidade, atividades monopolistas, é natural
a presença do setor público para garantir o interesse do consumidor.

Esse papel duplo, de induzir o interesse do investidor privado e, ao mesmo tempo, garantir a situação do consumidor, é exercido no mundo pelas agências reguladoras.
Essas agências atuam de forma independente do poder executivo, e são dirigidas por especialistas em suas respectivas áreas, sem vínculos partidários. Isso garante
a criação de um marco regulatório confiável e estável.
No Brasil, ao contrário, depois de uma posição inicial mais favorável, as agências reguladoras passaram na atuar com objetivos políticos, até mesmo de geração de empregos, deixando de exercer o papel de independência e não criando marcos
regulatórios estáveis e confiáveis.

Vale destacar, por fim, o desafio de se criar um ambiente mais favorável aos investidores. Estudo efetuado pelo Banco Mundial (“Doing Business”) mostra que o Brasil apresenta um dos piores ambientes para se investir, sendo o 127º numa
amostra de 183 países. Entende-se por “ambiente para investimentos” um conjunto de aspectos que facilitam ou dificultam a vida das empresas, tais como: condições de abertura e fechamento de empresas, obtenção de licença ambiental, licença para uso do solo, desembaraço de mercadorias nos portos, complexidade da legislação trabalhista, carga tributária, e assim por
diante.
Certamente, a superação desses desafios, em especial a recuperação da capacidade de investimento do setor público, pode elevar a taxa de investimento e, por consequência,
a capacidade de crescimento potencial do PIB, aproximando-se dos países emergentes mais dinâmicos do mundo.

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